segunda-feira, 9 de outubro de 2017

Que quis dizer o Cardeal Burke quando afirmou que a FSSPX está em cisma?

Durante uma sessão de perguntas e respostas no fim de uma conferência sobre Liturgia, que aconteceu em Medford (Estado Unidos), o Cardeal Raymond Leo Burke disse que a Fraternidade de São Pio X (FSSPX) se encontra em cisma. Apesar de ter sido em Julho, esta gravação foi recentemente revelada e rapidamente se tornou "viral". Estas declarações do Cardeal Burke apanharam muitos de surpresa, até porque a própria Santa Sé não diz que a FSSPX é cismática. 

Cardeal Castríllon

Em Agosto de 2005, apenas 4 meses depois de ser eleito, o Papa Bento recebeu o Superior Geral da FSSPX, Mons. Bernard Fellay, em Castel Gandolfo. À direita do Papa estava o Cardeal Darío Castrillón Hoyos, presidente da Pontifícia Commissão “Ecclesia Dei”. Este mesmo Cardeal foi entrevistado 1 mês depois pela revista '30 Giorni', ligada ao movimento Comunhão e Libertação (CL) e disse que a sagração episcopal realizadas pelo Arcebispo Marcel Lefebvre em Écône no ano de 1998 "não se tratou de um cisma formal".

Quando o entrevistador aludiu para a necessidade que a FSSPX reconhecesse a legitimidade do actual Pontífice, responde o Cardeal Castrillón: "A Fraternidade reconheceu sempre João Paulo II, e agora Bento XVI, como o legítimo sucessor de São Pedro."

Bem mais recentemente, em Março de 2017, o Cardeal Castrillón deu uma entrevista à 'Rome Reports' (ligada ao Opus Dei) na qual afirmou:   

"A FSSPX, tecnicamente, nunca caiu em cisma absoluto ou heresia. Por exemplo, eles nunca criaram uma jurisdição separada, porque criar uma jurisdição fora da jurisdição da Igreja significa querer a separação."

D. Athanasius Schneider

Durante uma entrevista ao 'Adelante la Fe', em Agosto de 2015, D. Athanasius Schneider revelou que foi enviado pela Santa Sé como visitador aos seminários da FSSPX para verificar como decorria a formação dos seminaristas. O Bispo auxiliar de Astana é bastante claro ao descrever o que viu:

"Guardo muito boa impressão de minhas visitas. O espírito do 'sentire cum ecclesia' da FSSPX ficou claro quando me receberam como enviado da Santa Sé com verdadeiro respeito e muita cordialidade. Ainda, em ambos os seminários me alegrou ver na entrada a fotografia do Papa Francisco, o Pontífice actualmente reinante. Nas sacristias havia placas com o nome de S.S. Francisco e do ordinário da diocese. Comoveu-me o cântico da oração tradicional pelo Papa (Oremus pro pontifice nostro Francisco) durante a solene exposição do Santíssimo Sacramento. Que eu saiba, não há razões de peso para negar aos sacerdotes e fiéis da FSSPX um reconhecimento canónico oficial, antes, deve-se aceitá-los como são por ora."

Papa Francisco

Em Maio de 2016, o Papa Francisco deu uma entrevista ao 'La Croix'. Quando lhe perguntaram sobre o encontro com Mons. Fellay e o possível acordo com a FSSPX respondeu:

"Conheci-os em Buenos Aires e falava com eles frequentemente. Cumprimentavam-me, ajoelhavam-se e pediam que os abençoasse. Dizem que são católicos. Eles amam a Igreja. (...) Acredito, como disse na Argentina, que são Católicos a caminho da comunhão plena."

Cisma

A palavra 'cisma', quando aplicada no ambiente eclesial tem normalmente o valor de separação completa, ou seja de cisma formal. Este é o caso, por exemplo, dos Ortodoxos, que há cerca de 1000 anos se separaram da Igreja Católica. Os Ortodoxos são cismáticos porque recusam da autoridade do Papa, que dizem ser um Bispo igual ao outros em termos de jurisdição, atribuindo-lhe, no máximo, o título de primus inter pares (primeiro entre iguais). Mas o Papa não é igual aos outros Bispos, é o único que na Igreja possui o poder ordinário, supremo, pleno, imediato e universal. Os Ortodoxos criaram também hierarquias próprias nas dioceses, à margem da hierarquia católica.

A FSSPX não fez nada disto. Sempre reconheceu a autoridade do Papa, como a Igreja defendeu desde o seu início. E além disso, como apontou o Cardeal Castrillón, jamais atribuiu aos 4 Bispos sagrados em Écône uma jurisdição territorial, reconhecendo sempre a jurisdição dos Bispos locais.

O Papa Francisco concedeu a jurisdição universal a todos os sacerdotes da FSSPX para poderem confessar fiéis onde quer que se encontrem. Podem cismáticos ter jurisdição na Igreja? 

Levando tudo isto em conta, parece que o Cardeal Burke terá usado a palavra 'cisma' não em termos de cisma formal mas de cisma material, que implica a falta de intenção em separar-se. A palavra 'cisma' pode ter também um sentido mais coloquial. Diz-se, frequentemente, que alguém que insiste muito num determinado assunto está a "cismar" com aquilo. Não quer dizer com isto que se afastou totalmente das nossas relações ou da comunhão para connosco. A situação jurídica da FSSPX é de facto anómala, ninguém nega essa evidência. Mas disto não decorre que a Fraternidade esteja fora da Igreja ou fora da comunhão com a Igreja.

João Silveira


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2 comentários:

Anónimo disse...

A FSSPX não está em plena comunhão com a Igreja. Os ortodoxos também não estão. Ambos por situações e formas diferentes, por isso, é inconveniente querer comparar os dois cismas de igual forma. Um pode ser mais "cismático" que outro, isso é óbvio, mas não justifica. O esforço de comunhão me parece ser mais do Papa do que da própria Fraternidade. Ora, se a mencionada fraternidade reconhece a autoridade do Papa então deve reconhecer também que “Roma Locuta est, Causa Finita Est” (Roma falou, assunto encerrado) e, enquanto a fraternidade não estiver em comunhão plena com a Igreja, então estará sim em Cisma e foi isso que o Cardeal Burke quis dizer, portanto, é muita ousadia do autor deste texto querer dar uma nova interpretação às palavras do cardeal para "minimizar" ou ainda "justificar" a cisão da fraternidade para com a Igreja. Não há justificativa! Agora, é inegável que há tentativa de comunhão, fato é que enquanto esta comunhão não se torna realidade a fraternidade está em CISMA e continuaremos rezando para que seja feita a vontade de Deus por meio da Sua Igreja.

Anónimo disse...

Plena Comunhão?

O problema é: que significa estar em "plena comunhão"?

Esta expressão já é modernista na Teologia.

Ou se está em comunhão, ou não se está em comunhão.

O sentido da expressão "Comunhão" é explicado na Encíclica "Satis Cognitum".

O que querem? Estar em "plena comunhão" com todo o que diz e pensa o Papa Francisco...

Acho que nenhum Católico de bom juízo poderia estar nessa "plena comunhão", não?

Para permanecer católico hoje não pode, nem deve, se ter esse tipo de "plena comunhão",

que mesmo não exigida, poderia ter-se com um Papa como São Pio X.

Isso já o explicou muito bem Dom Lefebvre - faz muitos anos -

nos últimos capítulos da "carta aberta aos católicos perplexos".

Podem ver a explicação também no livro "A candeia debaixo do alqueire",

do Pe. Álvaro Calderon.